Newsletters 4
Outubro 2021
Documentando a singularidade da área do Pico de São Tomé
Realizamos uma expedição botânica no Pico de São Tomé que revelou a singularidade da cintura de vegetação de Erica, a qual ocorre em cumes acima dos 1900 m. Pela primeira vez, foram realizados inventários de vegetação na área, revelando que este ecossistema único não só ocupa uma área muito restrita, mas também está fortemente ameaçado por espécies invasoras, cuja abundância é consequência do corte da vegetação e do plantio de Cinchona spp. (Quina) durante a primeira metade do século 20 Estimamos que até 90% da extensão natural desse habitat já possa ter sido perdida. Um dos botânicos da equipa, Olivier Lachenaud, também recolheu e identificou uma nova espécie de Renealmia, uma erva gigante pertencente à família do Gengibre, que está restrita à zona acima de 1900 m de altitude, ou seja, uma área de aproximadamente 25 ha. A equipa também começou a documentar a abundância de Balthasaria mannii, uma espécie endémica rara. Suspeitava-se que que essa espécie estivesse extinta, mas entretanto foi encontrado um indivíduo durante os nossos inventários realizados no início do projeto, em Outubro 2019; actualmente, apenas foram encontrados mais 15 indivíduos, durante a nossa última campanha de campo intensiva, em Setembro de 2021. Além disso, não foram observadas mudas, o que sugere que a regeneração da espécie é fraca ou inexistente. Estas observações, confirmam a nossa avaliação de que esta espécie está criticamente ameaçada de extinção (avaliação submetida à Lista Vermelha). Este ecossistema, caracterizado pela vegetação de Erica thomensis e pela flora única que abriga, exige urgentemente ações de conservação dedicadas e mais estudos para fortalecer a nossa compreensão da sua dinâmica e resiliência às mudanças ambientais.
Workshop de Áreas Chave da Biodiversidade
Um workshop sobre as Áreas Chave da Biodiversidade (KBAs) de São Tomé e Príncipe foi realizado durante cinco dias em Setembro de 2021, organizado pela Birdlife International e vários outros parceiros, incluindo a Wildlife Conservation Society (WCS), Missouri Botanical Garden (MBG), Fundação Príncipe, Fauna & Flora International (FFI), Centro para Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c) da Universidade de Lisboa e Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra. Os primeiros dois dias foram dedicados à formação ministrada por Eleuterio Duarte da WCS Moçambique. Em seguida, a equipa do projeto aplicou os critérios de KBAs a espécies de plantas, enquanto outros participantes se focaram em dados faunísticos, com o objectivo de avaliar a rede existente de KBAs e testar hipóteses de novas KBAs potenciais, como o Vale da Ribeira Funda (próximo da comunidade Plancas), que foi identificado como um possível KBA com base em cinco espécies de plantas. Pela primeira vez, foram usados dados da flora para apoiar a identificação e caracterização de KBAs em São Tomé e Príncipe, cujos delineamentos anteriormente se baseavam apenas em dados faunísticos, especialmente de aves.
Principais avanços no conhecimento sobre a distribuição e diversidade de plantas
Durante os dois anos do projecto, e apesar das muitas dificuldades relacionadas com a pandemia de Covid, extensos inventários foram realizados em ambas as ilhas. Os resultados aumentaram significativamente o nosso conhecimento sobre a flora do país: foram realizadas mais de 2.900 colheitas (correspondendo a cerca de 20% de todos os registos georreferenciados já recolhidos no arquipélago), e representando 370 espécies de plantas, das quais mais de 50 foram registadas pela primeira vez no país e mais de 20 são novas para a ciência. Também aumentámos o conjunto de dados de transectos de vegetação que já existiam no Príncipe, estabelecendo 38 novos transectos. No geral, foram feitos 50 transectos de vegetação nas florestas de São Tomé (além de 50 transectos em áreas rurais e urbanas), juntamente com 56 transectos no Príncipe, produzindo dados muito precisos sobre a ocorrência de árvores e sua abundância nas duas ilhas, e tornando possível fornecer uma estimativa mais informada do risco de extinção para as espécies de plantas endémicas, e ao mesmo tempo identificar os habitats ameaçados.